Importante palestra foi ministrada na noite de ontem, na sala de reuniões do Paço Municipal, referente a Febre Maculosa Brasileira, pela professora Dejanira de Angeli do Departamento de Biociências da Unesp de Rio Claro, a convite do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente.
Na ocasião foi levantada a necessidade de serem criadas formas para que uma ampla divulgação dessa campanha ocorra em alerta a população em geral.
“A febre maculosa é uma doença infecciosa aguda, causada por bactérias de gênero Rickettisia e transmitida através da saliva de carrapatos infectados.
Não é transmitido de pessoa a pessoa e os humanos são hospedeiros acidentais
dentro da cadeia epidemiológica. A evolução da doença pode se dar de forma
assintomática, com sintomatologia discreta até formas graves com elevada taxa
de letalidade. A bactéria gram-negativa, intracelular obrigatória, denominada Rickettisia rickettsii é a responsável pela doença.
No Brasil, o principal vetor é o carrapato Amblyomma cajennense (carrapato estrela). Outras espécies devem ser consideradas como potenciais transmissoras da doença.
Hospedeiros: Animais silvestres (capivaras, gambás, pequenos roedores, aves, répteis) e carrapato.
Em nosso país, o A. cajennense é vulgarmente conhecido como “carrapato estrela”.
As larvas ou as ninfas desses carrapatos são denominadas popularmente de
“micuim”, “carrapato pólvora”, “carrapato-fogo”, “carrapato meio-chumbo” e “carrapatinho”. Vários animais domésticos e ampla diversidade de espécies
silvestres (entre mamíferos e aves) podem albergar algum estádio parasitário
deste carrapato.
No Brasil, as infestações por larvas ou micuins são observadas particularmente
a partir dos meses de março-abril até meados de julho quando se inicia o
período ninfal. As larvas podem permanecer no ambiente até seis meses sem se
alimentar. Após a fixação no hospedeiro, elas iniciam o repasto (linfa e/ou
sangue e tecidos digeridos) durante aproximadamente cinco dias. Após este
período, as larvas desprendem-se do hospedeiro, caem no chão e buscam abrigo no
solo para realizar uma muda para o estágio ninfal, que ocorre em um período
médio de 25 dias. A ninfa (“vermelhinho”) pode aguardar em jejum pelo
hospedeiro por um período estimado de até um ano. Seu período máximo de
atividade é observado durante os meses de julho a outubro, podendo também
ocorrer durante o ano todo dependendo das condições ambientais do local onde
está ocorrendo. Encontrando o segundo hospedeiro, a ninfa se fixa e inicia um
período de alimentação de aproximadamente 5 a 7 dias quando, completamente ingurgitada, se solta do hospedeiro, cai no chão e realiza a segunda muda. Após um período de aproximadamente 25 dias emergem um macho ou uma fêmea jovem que, em 7 dias, encontra-se apta a realizar seu terceiro estádio parasitário. Neste ambiente,
os adultos podem permanecer sem se alimentar, por um período de até 24 meses,
aguardando o hospedeiro. Quando isto acontece, machos e fêmeas fixam-se, fazem
um repasto tissular e sanguíneo, acasalam-se e a fêmea fertilizada inicia um
processo de ingurgitamento que finda num prazo aproximado de 10 dias. Após este
período, as fêmeas fecundadas e ingurgitadas se desprendem do hospedeiro,
caindo no solo para realizar postura única (5.000 a 18.000 ovos) iniciando uma
nova geração. Esta fase, observada durante os meses de outubro a março,
completa o ciclo biológico e indica a ocorrência de uma geração anual da
espécie.
Portanto, além de vetores, os carrapatos são verdadeiros reservatórios da
bactéria, uma vez que todas as fases evolutivas, no ambiente, são
potencialmente capazes de permanecer infectadas meses ou anos à espera do
hospedeiro, garantido um foco endêmico prolongado. O homem adquire a bactéria
após ter sido picado pelo carrapato. Vale ressaltar que, para que haja a
transmissão da febre maculosa através da picada por carrapatos, estes devem
permanecer fixados a pele do hospedeiro por um período de 4-10 horas, tempo
necessário para uma possível reativação da R. rickettsii na glândula salivar do
carrapato.
As capivaras – reconhecidas como reservatórios naturais do agente causal da
febre maculosa no nosso meio – quando confinadas, podem sofrer infestações
maciças. Os casos de febre maculosa em humanos vão estar diretamente
relacionados à superpopulação de A. cajennense, pois quanto maior a população
desse carrapato, mais intensamente o homem será infestado e maior a chance de
um carrapato infectado picá-lo. Em regiões onde a população de A.
cajennense esta
sobre controle natural ou artificial, o homem é menos infestado pelo carrapato,
facilitando a retirada dos ectoparasitas do corpo antes que a bactéria seja
transmitida e diminuindo drasticamente as chances de desenvolver a doença. Daí
a importância das criações de eqüinos e capivaras na epidemiologia da febre maculosa.
Essas espécies animais são essenciais para o desenvolvimento dos adultos do A.
cajennense que, ao
contrário das outras fases, se alimenta com sucesso em poucos mamíferos. Assim,
quanto maior a densidade populacional desses animais, maior a disponibilidade
de hospedeiro para a fase adulta do ectoparasita, fator primordial para o
aumento exponencial da população do carrapato.
Patogenia
A bactéria ataca as células que revestem os vasos sanguíneos, ocasionando graves
distúrbios circulatórios no organismo. As lesões vasculares disseminadas
constituem a base fisiopatológica do quadro clínico: acúmulo anormal de líquido
(edema), aumento do volume extracelular com conseqüentes baixa pressão
sanguínea (hipotensão), morte tecidual (necrose) local, e distúrbios da
coagulação (coagulação intravascular disseminada). Ocorrem obstruções(infartos)
de vasos sanguíneas, com subseqüente suspensão da irrigação sangüinea(isquemia)
no cérebro, principalmente no mesencéfalo e nas regiões dos núcleos, e, menos
freqüentemente, no coração. No fígado, pode haver lesão ao redor dos vasos
(perivascular), com degeneração gordurosa das células do fígado(hepatócitos).
As alterações renais consistem de lesões vasculares intersticiais focais,
acometendo poucos néfrons.
Sinais clínicos
No homem o período de incubação varia de 2 a 14 dias. Inicia com febre, dor de cabeça
(cefaléia), dores musculares(mialgia), náuseas e vômitos. Entre o 3º e 4º dia
surgem as manifestações cutâneas como manchas(máculas) papulares róseo
avermelhadas, predominando nos membros erradiando para palmas, solas e tronco.
Nos casos graves, com o desenvolvimento da doença, as pápulas vão se
transformando em hemorrágicas. Alguns casos evoluem gravemente, ocorrendo a
morte dos tecidos nas áreas de sufusões hemorrágicas (extravasamento de
sangue), em decorrência da inflamação generalizada dos vasos sanguíneos.
Se não tratado, o paciente evolui para um estágio de mal-estar caracterizado pela
diminuição da sensibilidade (torpor), confusão mental, freqüentes alterações
psicomotoras, chegando ao coma profundo. Icterícia leve e convulsões podem
ocorrer na fase terminal.
Diagnóstico específico
Sorológico (Imunofluorescência Indireta, Elisa, Reação de Weil-Felix)
Tratamento
A indicação do tratamento deve ser baseada principalmente na suspeita clínica e
no histórico de acesso a áreas com infestação de carrapatos A letalidade
diminui drasticamente se o tratamento for feito em tempo hábil. Cerca de 80%
dos indivíduos, com forma grave, se não diagnosticados e tratados a tempo
evoluem para óbito.
As drogas de escolha podem ser tetraciclina e cloranfenicol.
Prevenção e Controle
Pode-se recomendar a seguintes medidas para prevenir e controlar a febre maculosa em
humanos no meio rural:ter em mente quais são as áreas consideradas endêmicas para a febre maculosa;
• manter a população de A. cajennense sob controle. Nas regiões onde há presença de
carrapatos, aplicar o controle químico nos animais domésticos e de produção. Em
especial, fazer um controle rígido em criações de eqüídeos. Nas regiões de
preservação ambiental, onde há presença de capivaras ou antas, controlar o
acesso desses animais às áreas onde há circulação de humanos uma vez que o
aumento da densidade populacional desses mamíferos silvestres tem incrementado
exponencialmente a população de A. cajennense;
• manter o gramado aparado em ambientes domiciliares e de acesso à população
humana;
• evitar caminhar em áreas reconhecidamente infestadas por carrapatos;
•utilizar barreiras físicas no corpo, como camisas e calças e compridas, com a
parte inferior por dentro de botas. Bainhas de tecido ou fita de dupla face na
parte superior de botas também são recomendadas;
• usar roupas de cores claras permitindo uma melhor visualização dos carrapatos;
• quando a exposição a carrapatos é inevitável, ao caminhar por estas áreas, checar o
corpo em busca de carrapatos em intervalos de 2 a 3 horas, pois quanto mais
rápido for retirado um carrapato fixado, menores serão os riscos de contrair a
doença;
• retirar os carrapatos com cuidado, se possível com auxílio de uma pinça, através de
torções leves, seguidas de movimentos de tração, permitindo que eles sejam
retirados inteiros;
• não puxar o ectoparasita pelo abdômen, não queimar nem expor o ectoparasita a
qualquer tipo de substância, não perfurar nem espremer os carrapatos com as
unhas;
• no caso de cães do meio rural, prevenir infestação de carrapatos tratando-os com
produtos carrapaticidas;
• cuidado especial com cães de áreas urbanas que têm contato esporádico com o meio rural, pois estes, por nunca terem entrado em contato com a R. rickettsii, estão mais susceptíveis à infecção. O ideal é que os cães sejam tratados com carrapaticidas imediatamente após o retorno de áreas rurais infestadas por carrapatos.”